As ilhas de São Tomé e Príncipe localizadas no Golfo da Guiné, cerca de 300 km da costa do Gabão, constituem o segundo país mais pequeno de África, com uma superfície de 1.001 km² e uma população total de 187.360 (2012). A grande maioria da população vive em São Tomé (859 km²) onde se encontra a capital homónima, enquanto o Príncipe (142 km²), situado 150 km ao norte de São Tomé, tem apenas 7.540 habitantes. O arquipélago é de origem vulcânica fazendo parte da linha dos Camarões, uma falha geológica que se estende do Chade através do Monte Camarções até à pequena ilha de Annobón. São Tomé e Príncipe é uma sociedade crioula, marcada por uma longa história de economia de plantação, cujas origens remontam ao ano de 1493 quando começou o povoamento efetivo de São Tomé, cerca vinte anos depois do descobrimento do arquipélago desabitado por navegadores portugueses. A colonização do Príncipe começou por volta de 1500.

Os primeiros habitantes de São Tomé eram colonos vindos de Portugal, entre os quais muitos degredados e crianças judias, separadas pela força dos seus pais, assim como escravos do continente africano. Inicialmente os escravos vieram do Reino do Benim (atual Nigéria) e logo a seguir do Congo e de Angola. No início da colonização, quase todas as plantas alimentares e de rendimento, entre as quais a cana-de-açúcar, assim como animais domésticos foram introduzidos das Américas, Africa e Europa. Depois de Cabo Verde, São Tomé e Príncipe foi o segundo território, onde brancos e africanos viviam permanentemente juntos. Na sua grande maioria, a comunidade branca era constituída por homens que viviam juntos com mulheres africanas. Consequentemente, a colonização das ilhas coincidiu com um processo de mestiçagem biológica, mas também cultural. Este processo de crioulização, a mistura de elementos culturais africanos e europeus, no contexto de dominação portuguesa, resultou na emergência de uma sociedade crioula, com a sua própria língua e cultura, durante o séc. XVI.

Ao pedido dos primeiros moradores de São Tomé, em 1515, por decreto real, as mulheres negras dos moradores brancos e os seus filhos mestiços foram libertados. Em 1517, também foram alforriados por decreto real os homens africanos que tinham chegado com os primeiros colonos. Assim surgiu o grupo dos africanos livres do arquipélago, conhecidos por forros, que participaram ativamente na construção da sociedade e da economia de São Tomé e Príncipe.

Os mestiços e africanos livres tiveram o direito de ocupar cargos na administração colonial, na câmara municipal, na milícia e na Igreja Católica que chegou logo com os primeiros colonos. A diocese de São Tomé, a segunda de África, foi criada em 1534. No ano seguinte, a povoação principal foi elevada à cidade de São Tomé. Inicialmente os moradores dedicaram-se ao tráfico de escravos. Um número considerável de escravos permaneceu no arquipélago apenas à espera da re-exportação, enquanto outros ficaram definitivamente como escravos domésticos e agrícolas. A produção de açúcar começou por volta de 1517, ano em que os primeiros engenhos de açúcar em São Tomé são documentados. O tráfico de escravos sempre continuou, contudo, no decorrer do século XVI, com a emergência de Luanda como mercado de escravos, São Tomé perdeu relevância como entreposto do tráfico negreiro.

Durante o século XVI, São Tomé tornou-se um grande produtor de açúcar que necessitava cada vez mais da mão-de-obra escrava. Com o incremento da população escrava aumentou também o número de escravos que fugiram para a inacessível floresta densa no interior montanhoso da ilha. Inicialmente os escravos auto-libertados no interior de São Tomé eram conhecidos por macambos. Desde o século XIX, os seus descendentes são conhecidos por angolares, que ainda hoje constituem um grupo cultural e linguisticamente distinto em São Tomé. Em 1595, São Tomé foi abalado por uma revolta dos escravos, liderados por Amador, que mobilizou cerca de 5.000 escravos contra as tropas do governador. Depois de três semanas a revolta terminou com a derrota dos revoltosos e a execução de Amador. Na altura da rebelião, a indústria de açúcar nas ilhas já estava em declínio, sobretudo devido à melhor qualidade do açúcar do Brasil, onde a produção em larga escala tinha começado por volta de 1530. Durante a ocupação de São Tomé pelos holandeses, de 1641 a 1648, houve ainda um incremento ligeiro da produção de açúcar, mas a indústria açucareira desapareceu definitivamente na segunda metade do século XVII. O tráfico de escravos continuou em pequena escala, enquanto a agricultura produziu apenas para a subsistência e o abastecimento de navios negreiros que passaram pelas ilhas rumo às Américas. O declínio económico era acompanhado por uma descida demográfica, com uma quase ausência de brancos, o que, geneticamente, levou a uma re-africanização da população. Durante este período, o arquipélago foi dominado pela elite crioula, sendo muitos dos seus membros também donos e comerciantes de escravos.

A introdução de novas culturas de rendimento do Brasil, nomeadamente o café (1787) e o cacau (ca. 1820), associada à independência do Brasil (1822) e o fim do tráfico de escravos (1836) resultaram numa re-colonização das ilhas por Portugal e o re-estabelecimento da economia de plantação, desde os meados do século XIX. A expansão das plantações de café e cacau e a implementação do colonialismo moderno pelos portugueses levou a marginalização económica e política dos proprietários forros que quase todos perderam as suas terras durante o processo.

Geralmente, os forros e angolares recusaram-se de trabalhar nas plantações, as roças, visto que consideram ‘o trabalho escravo’ abaixo do seu estatuto social. Depois da abolição de escravatura no arquipélago, em 1875, os escravos eram logo substituídos pelos chamados serviçais, contratados primeiro em Angola e posteriormente também em Cabo Verde (desde 1903) e em Moçambique (desde 1908). Desde a viragem do século até aos anos de 1940, os contratados africanos, que viviam espacialmente separados dos ilhéus nas senzalas das roças, ultrapassaram os crioulos nativos em número. Frequentemente, as condições de vida dos contratados não eram muito diferentes das dos escravos antes. Em 1909, acusações da continuação de escravatura em São Tomé e Príncipe por filantropos ingleses culminaram em um boicote do chamado ‘cacau escavo’ por chocolateiros britânicos.

© Fotografia do livro “A mão d'obra em S. Thomé e Príncipe” de Francisco Mantero

© Fotografia do livro “A mão d’obra em S. Thomé e Príncipe” de Francisco Mantero

Nos fins do século XIX, a maior parte das terras agrícolas pertenceu às grandes roças de europeus. Nesta altura, o café, inicialmente a cultura principal, tinha sido ultrapassado pelo cacau. A maior produção de cacau ocorreu na primeira década do século XX quando São Tomé e Príncipe, durante poucos anos, foi o maior produtor de cacau no mundo. Contudo, depois da I Guerra Mundial, a produção de cacau começou a diminuir gradualmente devido a concorrência dos pequenos produtores no continente africano, a erosão e a infestação dos cacaueiros por pragas. A produção de cacau nunca mais atingiu os volumes anteriores, contudo, sempre permaneceu o principal produto de exportação de bens, até hoje. Desde a época colonial até à actualidade houve várias tentativas da diversificação da produção agrícola, mas em vão, pos a monocultura de cacau permaneceu.

Depois da II Guerra Mundial, o então governador, Carlos Gorgulho (1945-1953), iniciou uma política de modernização para atrair mais colonos brancos a fixar-se nas ilhas. Em Fevereiro de 1953, as suas tentativas de aumentar a produção agrícola levou a boatos que o governador queria obrigar os forros a trabalhar nas roças. A uma revolta espontânea da população provocada pelo assassino de um homem pela polícia, Gorgulho respondeu com uma onda de violência contra a população indefesa que vitimou inúmeras pessoas inocentes. Nos anos de 1960, o Massacre de Fevereiro de 1953, serviu aos primeiros nacionalistas são-tomenses para condenar o colonialismo português e reivindicar a independência das ilhas. Finalmente a independência veio em 12 de Julho de 1975, em sequência da Revolução de 25 de Abril de 1974 em Portugal. Condicionado pelo contexto político internacional nos anos de 1970, depois da independência São Tomé e Príncipe tornou-se um Estado de partido único, baseado no modelo soviético. As plantações e toda a economia foram nacionalizadas. As nacionalizações e a falta de quadros em todos os sectores da economia e administração resultaram numa queda da produção das roças e numa grave crise económica que, em 1987, levaram o regime socialista a aceitar uma liberalização económica e política. Este processo culminou com a introdução do multipartidarismo modelado no regime semipresidencial português, em 1990. Desde então houve regularmente eleições que várias vezes resultaram numa mudança de governo. Contudo, o regime democrático tem sido marcado pela instabilidade, visto que, desde a transição democrática, nenhum governo conseguiu completar a legislatura de quatro anos. No plano económico, desde muito tempo, o arquipélago empobrecido é largamente dependente das ajudas internacionais, visto que vários projectos de aumentar a produção agrícola não deram os resultados pretendidos e o desenvolvimento do turismo foi muito aquém do esperado. Esperanças de o pais se tornar produtor de petróleo, que existem desde 1997, também não se realizaram, pelo menos por enquanto.

Gerhard Seibert
Centro de Estudos Internacionais (CEI)
ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL)

Mapa de S. Tomé da autoria do Holandês Johannes Vingboons, perto de 1655